terça-feira, 24 de junho de 2014

Mergulho no Tietê II

Figura 1 - Barragem de Três Irmãos. Fonte: Google Maps.
Há cerca de dois anos atrás fiz meu primeiro mergulho SCUBA no rio Tietê, no município de Itapura, interior de São Paulo. Depois deste, fiz alguns outros mergulhos por lá e o mais recente foi este, onde mergulhei em um ponto diferente, um drift no canal de navegação da Hidrovia Tietê-Paraná, logo abaixo da Usina Hidrelétrica de Três Irmãos (Figura 1).

Partimos da Marina Urubupungá, localizada às margens do rio Paraná, próximo a Usina Hidrelétrica de Jupiá e, após 50 minutos de navegação, chegamos ao nosso ponto de mergulho. Logo vimos que a visibilidade estava boa, pois podíamos ver o fundo do rio. Ancoramos o barco para nos equiparmos e caímos na água, que estava com temperatura em torno de 24°C.

Figura 2 - Arraia nadando sobre o fundo 
coberto por filme de microalgas.
Assim que iniciamos o mergulho, já avistamos uma pequena arraia, passando tranquilamente sob nós (Figura 2). Descendo o rio carregados pela correnteza, notamos que as arraias seriam frequentes em nosso mergulho, já que a todo momento víamos algumas delas fugindo quando nos aproximávamos.

Figura 3 - Cascudo repousando sobre o leito do rio.
No início, seguimos pelo leito do rio, um pouco mais profundo, com cerca de 5m, onde, além das arraias, vimos também vários Cascudos (Figura 3). Mas para aproveitar ao máximo o mergulho, posicionei-me na transição entre a margem (um pouco mais rasa, cerca de 3m) e o leito do rio, bem marcada pela formação rochosa da região, como pode ser observada na figura Formação. Nesta posição era possível enxergar tanto o que estava no leito quanto o que estava próximo à margem. E assim foi até o final do mergulho.

Figura 4 - Formação rochosa do fundo do rio Tietê na região de Três Irmãos,
marcando a transição entre margem e leito do rio.
Próximo à margem, encontramos pequenos cardumes de porquinhos, tucunarés e tilápias. Já no leito, visualizamos um pequeno cardume de piaus e um pequeno cágado (tartaruga de água doce).

A seguir, algumas fotos e vídeos deste mergulho.
Planta aquática. Serve como abrigo e proteção para pequenos
peixes como esta Maria-mole.

Close up do Cascudo, peixe muito comum nesta região.
Cardume de Porquinhos.
Cardume de Tucunarés.
Mexilhão dourado envolto por filme de microalgas.
Detalhe do sifão do animal aberto.
Bóia utilizada no drift dive para marcar a posição dos
mergulhadores.
Embarcação Netuno vista por baixo.
Mergulhador Luís.
Mergulhadora Carol.
Retornando à Marina Urubupungá.
Ponte sobre o Rio Tietê no município de Itapura.






Log do mergulho
Local: Canal de navegação Hidrovia Tietê-Paraná em Três Irmãos - SP.
Data: 22/06/2014
Profundidade máxima: 5m
Temperatura da água: 24°C
Visibilidade: 8m
Tempo de fundo: 1h10min.
Embarcação: Netuno
Operação: Marina Urubupungá
Mergulhadores: Carol, Luís e Lia.

Para mais informações sobre mergulhos nesta região, acesse o site da Marina Urubupungá ou entre em contato com o blog.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Correntes Marinhas

Figura 1 – Principais giros nas Bacias Oceânicas do Atlântico,
Pacífico e Índico. Fonte: NOAA, 2013.
Os Oceanos nunca “descansam”? Nunca, os Oceanos estão sempre em movimento e isto exerce grande influência em nossas vidas. Neste artigo, vou tratar de forma bem simplificada como as correntes marinhas são formadas e alguns processos envolvidos.

Os movimentos mais intensos que ocorrem nos oceanos concentram-se principalmente em sua superfície e se dão na forma de correntes (Castro & Huber, 2003). Pode-se dizer que as correntes são formadas basicamente pela energia do sol. Quando a radiação solar atinge a superfície da Terra aquece a camada de ar circundante, que se movimenta de regiões mais quentes para as mais frias, formando os ventos, que  promovem a circulação da água através do atrito gerado pelo o contato da massa de ar com a superfície dos oceanos. A elevação na temperatura da água, também ocasionada pela energia solar irradiante, altera sua densidade, originando as correntes pela diferença entre a densidade de águas quentes (menos densa) e frias (mais densa). Essas alterações na temperatura da água influenciam as taxas de evaporação e precipitação, modificando a salinidade da água do mar, consequentemente, modificando a densidade da água e gerando as correntes.

Fatores como o movimento de rotação terrestre, distribuição de calor na superfície, sazonalidade (verão/inverno), presença dos continentes também podem influenciar no fluxo das correntes.

O movimento de rotação tem efeito importante no padrão de circulação dos oceanos, promove deflexão das correntes em 45°. Esse  desvio é chamado Força de Coriolis, onde no hemisfério norte é para direita, enquanto no hemisfério sul ocorre para a esquerda.

Como a irradiação do calor na superfície terrestre não é homogênea, a energia solar atinge a Terra mais intensamente na região equatorial, fazendo com que o ar se aqueça e suba. Deste modo, o ar frio das áreas adjacentes repõe o ar aquecido, criando assim os ventos. O ar quente que sobe à atmosfera nesta região se resfria ao atingir grandes altitudes e se movimenta na direção dos polos, descendendo acerca das latitudes de 30° norte e sul (Figura 2). Mas estes ventos não fluem diretamente para a região equatorial, eles são afetados pela Força de Coriolis, atingindo esta região em um ângulo de 45°, chamados Ventos Alísios. Estes ventos ocorrem na região tropical e sopram de leste para oeste.
Figura 2 – A camada de ar na região equatorial é aquecido e ascende à atmosfera (Warm air rises from equatorial regions). O ar frio das regiões adjacentes flui no sentido do Equador, criando assim os ventos. Estes ventos são chamados e Ventos Alísios e são defletidos em 45° pela Força de Coriolis (Air blows in to replace rising air, creating trade winds). Fonte Castro & Huber, 2003.

Este movimento do ar cria células de circulação atmosférica e são chamadas de Células de Hadley. Na região subtropical, compreendida entre as latitudes de 30° e 60°, tanto norte quanto sul, o movimento do ar é oposto ao que acontece na região tropical, fluindo de oeste para leste. Nos polos, o movimento do ar muda novamente de direção e passa a soprar de leste para oeste. A Figura 3 ilustra como o ar atmosférico se movimenta sobre a superfície terrestre.
Figura 3 – Os Ventos Alísios sopram entre as latitudes de 30° norte e sul (Northeast trades e Southeast trades) e são os ventos mais constantes. Os ventos de oeste (Westerlies) estão localizados entre as latitudes de 30° e 60°, tanto norte quanto sul. Acima das latitudes de 60° sopram os ventos mais inconstantes, os ventos polares de leste (Polar easterlies). Na região equatorial (latitude 0°) sopram ventos muitos fracos, conhecidos como Doldrums. Nesta figura estão representados os padrões de ventos em uma Terra imaginária, sem a presença dos continentes. Fonte: Castro & Huber, 2003.

Os Ventos Alísios são os mais constantes sobre a superfície terrestre e são os principais responsáveis pela formação dos grandes giros oceânicos, que são sistemas circulares de corrente de superfície presentes nas bacias oceânicas. No hemisfério norte estes giros se movimentam no sentido horário, enquanto no hemisfério sul giram no sentido anti-horário.

Estes giros são os responsáveis pelo transporte de calor da região equatorial para os polos. Devido à alta capacidade térmica da água, o calor absorvido na área tropical é transportado e liberado nas regiões polares. Por outro lado, a água resfriada nos polos flui em direção à região equatorial. Dessa forma, estes giros funcionam como reguladores da temperatura e do clima na Terra (Figura 4).
Figura 4 – Maiores correntes de superfície dos oceanos, os grandes giros se localizam nas bacias oceânicas do Atlântico, Pacífico e Índico. Fonte: Castro & Huber, 2003.
Mas as correntes marinhas não transportam apenas calor, elas também são usadas por várias espécies para migrar para diferentes regiões. Se você se lembra da animação “Procurando Nemo”, a estória mostra as tartarugas marinhas utilizando a Corrente Leste Australiana para se locomover para outras áreas. Muitos animais de grande porte, como baleias por exemplo, também costumam utilizar as correntes marinhas para realizar suas migrações. Outras espécies, que possuem parte do seu ciclo de vida planctônica, são dispersadas para outras regiões através destas correntes. Outro bom exemplo é o de Amyr Klink, que se valeu do conhecimento sobre correntes marinhas para atravessar o Oceano Atlântico em um caiaque.

Assim, compreender como as correntes marinhas são formadas e os processos envolvidos neste complexo sistema são de fundamental importância para entender como o clima em nosso planeta é regulado e compreender como a vida marinha é influenciada pelo movimento dos oceanos.

Referências Bibliográficas

Castro, P.; Huber, M. E. 2003. Marine Biology. Fourth Edition. The McGraw-Hill Companies. 456p.

Colling, A. 2001. Ocean Circulation. Second Edition. The Open University. 286p.

NOAA, 2013. Ocean Currents. Ocean Explorer. Acessado em 13/06/2014. 
http://oceanexplorer.noaa.gov/edu/learning/player/lesson08.html.

Tomczak, M.; Godfrey, J. S. 2005. Regional Oceanography: An Introduction. PDF Version 1.1. 391p. 

terça-feira, 10 de junho de 2014

Biologia e Ecologia do Lionfish

Figura 1 - Lionfish. Fonte: NOAA
(
http://oceanservice.noaa.gov/education/stories/lionfish/lion04_biology.html
O lionfish é um peixe muito comum em aquários de água salgada. Contudo, pouco se conhecia sobre sua biologia e ecologia antes de sua invasão e dispersão na costa leste norte-america e Caribe.

Este peixe tem vários nomes populares: lionfish, zebrafish, firefish, turkeyfish, red lionfish, butterfly cod, ornate butterfly-cod, peacock lionfish, red firefish, scorpion volitans, devil firefish (NOAA, 2011). Mas em português é peixe-leão mesmo.

Existem oito espécies de lionfish que pertencem ao gênero Pterois. Dentre estas, duas chamaram a atenção, pois foram encontradas muito longe de seu local de endemia. São elas Pterois volitans e Pterois miles, endêmicas do Indo-Pacífico, estas espécies foram avistadas pela primeira vez em 1992 na costa da Flórida e hoje se encontram dispersas até o nordeste dos Estados Unidos e por todo mar do Caribe (Morris, 2009; Moris et al, 2009). Entretanto, de acordo com Hamner e colaboradores (2007), P. volitans é a espécie mais abundante.

Reprodução
O período reprodutivo das espécies encontradas na Carolina do Norte e Bahamas pode se estender por todo ano (Morris, 2009; Moris et al, 2009). Espécies do gênero Pterois apresentam um sutil dimorfismo sexual apenas na fase de reprodução. Nesta fase ocorre a corte, que inclui movimentos circulatórios, movimentos ondulatórios laterais, perseguição e condução. Este ritual se inicia no final da tarde e segue até à noite. Após todo este ritual, a fêmea libera duas massas de ovos flutuantes que são fertilizados pelo macho e que ascendem até a superfície, tornando-se uma massa de ovos pelágica, ou seja, permanece na coluna d’água (Fishelson, 1975; Whitfield et al, 2002; Morris, 2009; Moris et al, 2009). Os ovos e os embriões ficam agrupados por um muco adesivo que se desintegra em poucos dias. Em seguida, os embriões/larvas se tornam planctônicas (Fishelson, 1975; Morris, 2009), ou seja, flutuam livremente na coluna d’água. A duração das larvas de lionfish varia entre 25-40 dias (Whitfield et al, 2002, Hare & Whitfield, 2003). A dispersão do lionfish ocorre provavelmente durante o período larval pelágica, quando pode atingir grandes distâncias (Morris, 2009).

Distribuição
O lionfish é natural do Indo-Pacífico, podendo ser encontrado no Mar Vermelho, Austrália e Malásia, Polinésia Francesa e Ilhas Pitcairn do Reino Unido, sul do Japão e Korea do Sul, Ilha Lord Howe e Ilhas Kermadec da Nova Zelândia, e também Micronésia (NOAA, 2011). A figura 2 mostra a distribuição do lionfish em sua região natural.
Figura 2 – Distribuição do lionfish (em rosa escuro) em sua região de endemia. Fonte: NOAA (http://oceanservice.noaa.gov/education/stories/lionfish/media/supp_factc.html).

Como espécie invasora, agora pode ser encontrado desde o nordeste dos Estados Unidos, toda costa leste norte-americana, Bahamas, Golfo do México e Mar do Caribe, até o leste da Venezuela (NOAA, 2011), como pode ser observado na figura 3.
Figura 3 – Distribuição do lionfish (pontos vermelhos). Pode-se observar a dispersão desde o nordeste dos Estados Unidos até o leste da Venezuela. Fonte: NOAA (http://nas.er.usgs.gov/taxgroup/fish/lionfishdistribution.aspx)

Habitat
O Lionfish pode habitar águas quentes em mares tropicais, recifes de coral, fundos rochosos, manguezais, pradarias e recifes artificiais. Já foram avistados exemplares desde águas rasas até cerca de 300m de profundidade (NOAA, 2011). Apesar de originalmente ser endêmico de águas quentes, Kimball e colaboradores (2004) relataram que esta espécie pode suportar águas frias, acerca de 10-12°C, com temperatura letal mínima de 10°C.

Ecologia
Figura 4 – Grupo de lionfishes. Comportamento comum desta espécie
no Atlântico. Foto: Moris et al, 2009.
Este animal apresenta comportamento sedentário (Fishelson, 1975; Whitfield et al, 2002) e movimentos lentos (NOAA, 2011). Assim, precisam se utilizar de sua coloração incomum e grandes nadadeiras para desencorajar potenciais predadores. São predadores ativos e no oceano Atlântico assumiram uma posição de topo na cadeira trófica, podendo predar cerca de 50 diferentes espécies de peixes, incluindo algumas econômica e ecologicamente importantes (NOAA, 2011).

Embora apresentem hábito noturno, no Atlântico são frequentemente vistos nadando sozinhos ou em pequenos grupos (figura 4) e têm sido encontrados com os estômagos cheios durante o dia. Costumam caçar suas presas perseguindo-as lentamente e encurralando-as com a abertura de suas grandes nadadeiras peitorais (NOAA, 2011).

Precauções
Figura 5 - Espinhos com glândulas de veneno
do lionfish. Foto: NOAA, 2011.
Lionfish é venenoso e não deve ser tocado! Seus espinhos (Figura 5) contêm glândulas de veneno, que é liberado quando pressionados. O veneno pode afetar a transmissão neuromuscular, podendo causar reações desde inchaço até dor extrema. Em alguns casos pode causar paralisia das extremidades inferiores e superiores em humanos. A ação do veneno vai depender de onde a vítima é atingida, de seu sistema imunológico e da quantidade de veneno liberada (Morris, 2009; Moris et al, 2009).


Referências Bibliográficas
Fishelson, L. 1975. Ethology and reproduction of pteroid fishes found in the Gulf of Aqaba (Red Sea), especially Dendrochirus brachypterus (Cuvier), (Pteroidae, Teleostei). Pubblicazioni della Stazione Zoologica di Napoli 39:635-656.

Hamner, R.M., D.W. Freshwater, and P.E. Whitfield. 2007. Mitochondrial cytochrome b analysis reveals two invasive lionfish species with strong founder effects in the western Atlantic. Journal of Fish Biology 71:214-222.

Hare, J.A. and P.E. Whitfield. 2003. An integrated assessment of the introduction of lionfish (Pterois volitans/miles complex) to the Western Atlantic Ocean. NOAA Technical Memorandum NOS NCCOS 2 p 21.

Kimball, M.E., J.M. Miller, P.E. Whitfield, and J.A. Hare. 2004. Thermal tolerance and potential distribution of invasive lionfish (Pterois volitans/miles complex) on the east coast of the United States. Marine Ecology Progress Series 283:269–278.

Morris, J. A. Jr. 2009. The Biology and Ecology of the Invasive Indo-Pacific Lionfish. A dissertation submitted to the Graduate Faculty of North Carolina State University. Doctor of Philosophy. Zoology. Raleigh, North Carolina.

Morris, J. A. Jr., J.L. Akins, A. Barse, D. Cerino, D.W. Freshwater, S.J. Green, R.C. Muñoz, C. Paris, and P.E. Whitfield. (2009). Biology and ecology of the invasive lionfishes, Pterois miles and Pterois volitans. Proceedings of the Gulf and Caribbean Fisheries Institute 29: ___-___.

NOAA. 2011. Lionfish Biology Fact Sheet. 

Whitfield, P. E.; Gardner, T.; Vives, S. P.; Gilligan, M. R.; Courtenay Jr.,W. R.; Ray, G. C.; Hare, J. A. 2002. Biological invasion of the Indo-Pacific lionfish Pterois volitans along the Atlantic coast of North America. Mar Ecol Prog Ser Vol. 235: 289–297.